segunda-feira, 14 de junho de 2004

Sorte macaca

Embora uma frequência regular seja estatisticamente mais credível, uma visitinha basta para constatar que um terço dos clientes do hipermercado Cactus é português. Nos outros este facto é igualmente patente; todavia, é no Cactus que a coisa é mais visível. Pronto, para não exagerar, digamos que um quarto dos clientes é português. Gente que não se coíbe de meter um papelinho na urna quando se trata de ganhar prémios; gente, sobretudo, que tem prazer (ou fé) suficiente para meter dezenas de papelinhos nas urnas quando os prémios são tentadores (automóveis, viagens, senhas para compras...) e na medida em que não tem que se mostrar a cara. Ora, logicamente, esperar-se-ia uma percentagem idêntica de premiados. Mas não! Não se sabe por que arte do diacho, em cada dez premiados aparece sempre um Scholer, um Reinhardt, um Rausch, um Hentges, um Brausch, um Entringer, um Jos qualquer coisa, Hostert por exemplo, um Emeringer, eventualmente um Piazzo, mas quase nunca um Silva, um Santos, um Pereira ou um Costa. Em TODOS os sorteios, a marosca se repete. Eninguém desconfia (porque aqui são todos muito honestos). E ninguém protesta: são as bolinhas da sorte!... nunca saem os nossos números... Tá bem, mas a gente tem metade dos números, caraças!!!

domingo, 13 de junho de 2004

Terra pátria

Ontem sofri, ainda que menos que o costume, com a derrota de Portugal frente à Grécia. De manhã tinha colocado na varanda uma bandeira de Portugal que orgulhosamente flutua ao ar fresco destes dias. A chuva enrolou-a várias vezes no seu mastro durante o dia como que a agoirar um mau resultado.
Assim foi. Perdemos e eu só não fiquei deprimido porque estava mais preocupado com grelhar as carnes do churrasco e com encher os copos de cerveja dos amigos que tinha em casa.
Depois do jogo de Portugal assistimos ao Rússia-Espanha. E eis senão quando a Irina se levanta ao escutar o hino russo. A Irina é Bielorrussa. Mudaste de nacionalidade, perguntei com uma ponta de maldade para tentar encavacá-la. Gosto tanto deste hino, disse ela. A resposta não me satisfez e fiquei com pena da Irina. Como é que alguém pode ter dúvidas quanto à sua pertença nacional? Como pode alguém levantar-se para homenagear o hino do vizinho?
A Irina não tem nacionalidade, tem um passaporte que diz que ela é bielorrussa. Mas podia dizer russa que ela ficava ainda mais satisfeita. As pessoas gostam de pertencer a países grandes? Talvez seja isso. Talvez seja mais prestigiante ser russo que bielorrusso. Eu gosto de ser português e não é por a Espanha ser maior e mais importante na cena internacional que me apetece prestar vassalagem ao meu amigo Juan Carlos.
Mas as minhas surpresas não ficaram por aqui. A Irina perguntou à minha inquilina se ela não estava a pensar mudar de nacionalidade. Portuguesa; sei lá... Isto quer dizer que a Irina já pensou em ser portuguesa. Talvez porque está apaixonada por um português. Talvez porque, para ela, tudo é melhor que ser bielorrusso.
A minha inquilina ficou surpresa e disse-lhe que não. Que gosta muito de ser polaca e que não troca a sua nacionalidade por nada. A Irina desistiu mas deve ter pensado que ser polaco é xunga e que a minha inquilina não está a ver bem o filme.
A Olga é russa, mas por via do casamento também tem passaporte francês. Sei que ela gosta de França e que outro dia disse que se sente mais francesa que outra coisa. Perguntei-lhe por isso por quem torceria ela numa eventual final do Euro 2004 que envolvesse a Rússia e a França. Como a Olga anda de candeias às avessas com o marido francês e até considera a possibilidade de regressar ao Caucaso, respondeu, depois de uns segundos de reflexão, Rússia. No entanto, a Olga não se levantou quando o hino russo tocou nem ficou muito aborrecida por causa da derrota com a Espanha.
É estranha a forma como alguns vivem a sua nacionalidade, como a assumem e por que valores a trocariam. Talvez eu seja conservador, talvez seja demasiado nacionalista, mas não consigo imaginar, na ordem actual das coisas, uma razão que me levasse a deixar de ser português. E é esse mesmo espírito que faz de mim pouco europeu. Que não me deixa levar até ao fim o raciocínio da união que a Europa prepara, porque não me quero diluir nesse "melting pot" de países em que ser português hoje pode equivaler a ser letão, irlandês ou romeno amanhã.

PS - A minha bandeira vai ficar na varanda até até terminar o Euro 2004 porque o meu orgulho nacional é também o de ser em Portugal que se joga este europeu. Manias de nacionalista...