terça-feira, 27 de março de 2007

Ideias, leva-as o vento...

Estou a ler um livro de um jornalista e investigador norte-americano publicado em 1943 (está esgotado, nem pensar em descobri-lo a não ser nalgum alfarrabista empoeirado). O assunto é o papel do ministro das Finanças do Terceiro Reich na reestruturação da economia alemã após o processo inflacionista e a ruína dos anos 20. O qual (Hjalmar Schacht), segundo o autor, conduziu a sociedade alemã (com uma forma moderna de proteccionismo) a um ponto tal que seguiria de olhos fechados, cantando e rindo, qualquer Hitler que lhe aparecesse pela frente.

Adiante. Notaram quando saiu esse livro? 1943. Escrito, portanto, muito antes de se pensar em desembarques na Normandia ou que a reviravolta de Stalinegrado fosse de facto irreversível. Nele, o autor (Paul Winkler) prevê que os "Prusso-Teutónicos" (conceito largo de Alemão mas perfeitamente actual, na época, ainda que objectivamente injurioso) iriam concretizar o seu objectivo de criação de uma união económica centro-europeia centrada na economia alemã sob a batuta da moeda alemã.

Até aqui, nenhuma semelhança com a União Económica Monetária e o sistema monetário europeu?

Ok, prossigamos. No livro há uma referência um trabalho de Charles Andler publicado em 1915, "Les origines du Pan-germanisme", no qual sintetiza as ideias de Friedrich List e outros economistas políticos do século XIX e defende uma «associação [de Estados] que teria de ser baseada no princípio de iguais privilégios para todos os membros».

Winkler cita um extracto interessante (mais hoje até do que em 1943) da obra de Andler, que é o seguinte: «É necessário organizar a Europa continental [...] Napoleão I, grande estratega, conhecia também os métodos da hegemonia económica. O seu sistema continental, que suscitou a oposição até de países que poderiam ter tirado proveito de um tal ordenamento, deveria ser reavivado, mas, desta vez, não como instrumento de dominação napoleónica. A ideia de uma Europa unificada num sólido bloco comercial já não choca ninguém caso seja a Alemanha a assumir a liderança de um tal bloco — não a França. A Bélgica, a Holanda, a Suíça, voluntariamente ou pela força, entrarão nesta 'Federação Aduaneira'. A Áustria será certamente conquistada [pela ideia]. Nem a França [...] será excluída. Os primeiros passos que a Confederação tomaria para assegurar a unidade de pensamento e de acção seria estabelecer um órgão comum representativo e organizar uma frota comum. Mas, claro, tanto a sede da Federação como o seu órgão parlamentar deveriam ser na Alemanha».

Tirando alguns pormenores... é giro, não é?

(Nota: longe de mim ilações sobre qualquer hipotético fio condutor independente de discordâncias políticas, guerras e outras tragédias; muito menos algum sorriso cínico sobre certos "sonhos" de certos pais, padrinhos e restante família)

4 comentários:

Terceiro no Quarto disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Terceiro no Quarto disse...

post interessante... permita-me apenas acrescentar que o projecto pan-europeu tem séculos, não sendo uma crição Nazi, nem pouco mais ou menos. aliás, desde os romanos, passando por Napoleao, ... que existe o sonho da europa unida, desde que "tanto a sede da Federação como o seu órgão parlamentar(...)" sejam no país de cada um!

Anónimo disse...

Ou eu li mal ou o post não diz que se trata de uma ideia nazi, mas sim de economistas políticos do séc. XIX e do princípio do séc. XX. Remeter o sonho de uma Europa unida aos romanos ou a Carlos Magno... enfim, é esticar um pouco a corda. Nem sequer as ideias atribuídas a Beethoven podem entender-se muito para além do processo de unificação dos Estados alemães. Penso que no post o relevante são os conceitos de união comercial e de união monetária entre Estados independentes, mas eu também não sei qual foi o objectivo do autor do post ao escrevê-lo.

Carlos Roso disse...

O objectivo é achar estranhamente parecido um projecto e uma realização. Luxemburga-mos: tens metade razão. Porque não são propriamente as ideias ou os sonhos que estão aqui em causa; é o estabelecimento (e publicação) de um autêntico programa, completo e detalhado, sobre uma união aduaneira (daquelas obras teóricas sobre as quais se edifica um sistema ou um regime). Claro que o final do século XIX foi pródigo em obras desse género, que ficaram por ali, mas outras (como se sabe, né?) inspiraram e fundamentaram regimes e sociedades...