terça-feira, 9 de setembro de 2003

SMSófetichismo

O meu telemóvel tem espaço a mais. Quando alguns engenheiros finlandeses decidiram que eu precisava de capacidades para guardar fotos que nunca tiro e jogar jogos que nunca jogo, artilharam-me o engenho com espaço em disco à bruta que agora me permite guardar centenas de SMS recebidos e enviados. É desastroso. Um ou dois toques nas liliputianas teclas e logo me saltam à vista pedaços ainda em carne viva da minha existência recente, a maior parte dos quais preferia (e até já tinha conseguido) ter esquecido e muitos dos quais preferia ter realmente vivido em vez de escrever "Tb acho k és fish".
Não contente com manter o que recebo, a máquina também insiste em guardar as inanidades que envio. Mas quem foi o animal que usou o meu telefone para escrever isto a esta gaja horrenda? Pois é, fui eu. O telefone é ainda mais rápido - e cru, porque nem temos direito ao olhar de compaixão - a atirar-te à cara os teus erros e omissões que uma tipa rancorosa.
Mas há pior. É quando esta arma poderosíssima cai nas mãos erradas. Não tenho dúvidas, as saudosas coscuvilheiras ficaram todas out of business: o telemóvel é ímpar em contar a coisa errada à miúda errada no momento errado e fá-lo muito mais barato que a boca humana. Podia haver uma opção qualquer "edit profile" que permitisse mudar o nome do remetente consoante as conveniências, mas nada; os escandinavos são tipos aborrecidos, os finlandeses, como todos sabemos, são pouco faladores. É mais provável que os novos modelos incluam uma capa anti-congelante para os lábios que uma opção de password para SMS.
No meio de tantos perigos, porque insisto em manter uma colecção tão representativa das minhas idas e vindas? Era bastante mais zen apagar tudo... Mas não posso. Não passo de um fetichista autocontemplativo e há poucos momentos melhores que, enquanto esperamos algo ou alguém, passar em revista a memória cache, aquela que despoleta tantas outras memórias. Masoquista? Quem, eu? Se só guardo umas 40 mensagens de cada vez... e até conheço outros que navegam por entre 200...

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